7 de novembro de 2011

Autótrofo

És como um Oroboro de significado deturpado. Não há religiosidade, misticismo ou qualquer doutrina de salvação e renovação no ato de alimentar-se de si próprio, em dor e tristeza, que são a matéria e a forma de tudo que se permite ser. Quanto mais produz, mais consome, quanto mais se tem, mais se quer, quanto mais dolorosa a pancada, mais digna a vida. Nem as pessoas que ama e para quem vive, por não poder viver por e para si próprio, uma vez que é pura grama, pura carne e puro nutriente, seriam capazes de mudar sua condição de incurável mártir. A piedade se converte em orgulho facilmente, e tu estraçalha-se com mais voracidade, na esperança de que não haja tempo para reconstituição e se desvaneça no incompreensível. Mas vítimas não cessam pragas. Se não doessem, de que serviriam os castigos? Como uma serpente sagrada ou um cão negligenciado, morde a própria calda e a boca cheia não o permite gritar de dor.

3 de novembro de 2011

Banquete

Pela primeira vez, talvez, uma faina consciente. Uma ânsia prazerosa acompanhada da esperança de satisfação. Chamem de fusão, conjugação, mas a mim parecia um único corpo que, dividido em dois por uma mente malévola ou desentendida, se contorcia para retornar ao seu estado uno. Um esforço que não carece de energia, lágrimas invisíveis, uma sutil indiferença ao desprezo de uma parte pela outra, de um meio corpo pelo outro, que me disseram ser falta de amor próprio. No alto da mais alta montanha, eis que tardiamente descubro que a mente sádica de ninguém mais era que do próprio ser com quem lutava prazerosamente. Não tive tempo para me preocupar com o empurrão e a iminente queda. Em minha cabeça repetiam-se as cenas e eu me matirizava por ter achado ser a metade correta, quando era o corpo errado.